Perdi a tarde hoje por conta de ser brasileira e viver no Brasil. A tarde. Inteira. Uma história que tinha tudo pra ser só alegria – e levar no máximo meia hora de vida pra resolver – mostrou para mim e pra amiga que não, o Brasil não anda.
Yaso está mudando pra Boston e vendendo coisas bacanas. Eu escolhi o que queria, conversei com ela, fechamos preço e, sabedora que tinha uns dólares aos cuidados do PayPal, negociamos com preço em dólar. Afinal, ela vai pros EUA e a cotação do dólar não cai nem com muito impeachment.
Só que o PayPal se recusava a enviar o meu saldo para a conta da Yaso. Ponto. O sistema simplesmente não deixava (e tentava cobrar o valor no cartão de crédito pré-pago, sem saldo). Lembrei do post do Jânio sobre o ótimo atendimento do PayPal e… corri pro telefone.
O atendente esclareceu que o motivo de não conseguir fazer a transação era: duas usuárias brasileiras tentando fazer negócio em outra moeda. Pra quê facilitar se a gente pode complicar, né mesmo, Brasil? E vejam, a culpa não é do sistema – é de um país que está cheio de leis (maioria não cumprida) que foram feitas só pra complicar o que é muito simples.
Claro que a Yaso criou outra conta, lá nos EUA, e a gente resolveu o assunto, aí, sim, em poucos segundos, como todos nós nerds/geeks e assemelhados estamos acostumados.
Pessoas queridas, em verdade vos digo: um país que prefere fazer seus cidadãos perderem tempo com coisas que não deveriam consumir tempo, está perdido. É vida consumida com o que não é pra dar trabalho.
Vejam: duas mulheres produtivas perderam 4 horas para resolver algo que se resolve em no máximo meia hora. As outras 3h30 (três horas e meia) são absolutamente improdutivas. Outro dia li uma manchete que dizia: um trabalhador americano produz como quatro brasileiros (procure a manchete no Google). A fonte é o The Conference Board, uma entidade que reúne empresas públicas e privadas de todo o mundo.
As razões? Não é só o ensino melhor e mais tempo na escola. É que eles vivem num lugar em que as coisas funcionam a favor. Querem um exemplo? Com vocês, Marco Gomes – que está em processo de instalação em NY:
A energia e o gás estarão funcionando no dia da mudança, sem eu sequer precisar estar presente no imóvel para ligarem. Imigrante deslumbrado
— Marco Gomes (@marcogomes) June 29, 2016
Juro que lembrei da minha primeira mudança aqui no Brasil: 2 dias sem energia elétrica por conta da burocracia da Eletropaulo referente a contas não pagas por algum morador anterior – devidamente resolvida, de forma rápida, com uma carteirada junto à Assessoria de Imprensa. E quem não é jornalista ou não conhece ninguém na empresa? Senta e espera.
A gente comemora PoupaTempo como se fosse a última maravilha. Fato é que o PoupaTempo não deveria existir – mesmo nele, a gente perde às vezes um dia para conseguir um documento ou resolver pendências. Este ano, segundo o estudo, a produtividade brasileira chegará ao mesmo nível da década de 50. Ou seja, enquanto o planeta inteiro entra no século 21 e vai pra frente, a gente anda pra trás – e grita alto quando apontam o fato.
O único povo, segundo a fonte, pior que o brasileiro são os argentinos. Os indianos produzem 383% mais que um americano.
E a gente passa vários dias, todos os anos, perdendo horas para resolver coisas que não precisam de horas – e podem girar a economia, porque nos liberam para produzir.
Caso 1: mandar o remédio de uso contínuo para a casa do ser humano em vez de fazer o cidadão (cidadã, no caso) perder uma hora e pouco no transporte (com metrô) e mais outra na sala de espera – pra evitar desvio de medicamento porque sim, os funcionários e distribuidores de remédios do Sistema Público fazem isso.
Caso 2: permitir que cidadão marque consulta no posto de saúde por telefone – ou pelo computador/celular, melhor ainda. Aqui, veja, talvez você economize o dia inteiro de trabalho. Você pode substituir posto de saúde por escola ou repartição pública e o raciocínio se mantém.
Em ambos os casos, você cria empregos, economiza o tempo do cidadão, oferece comodidade. Num país com mais de 220 milhões de cidadãos isso parece importante, não?
Foto: Edu Lauton, Unsplash, uso livre