Meninos e meninas. Brasileiros. Estes são os personagens do documentário Pro Dia Nascer Feliz, do João Jardim, que retrata a vida de nossos adolescentes nas escolas deste mundão sem pé nem cabeça chamado Brasil.
O diretor e a equipe fizeram um diário visual da vida deles em Manari, uma das cidades mais pobres do Brasil; Duque de Caxias, no Rio; em Sampa, Colégio Santa Cruz (sou ex-aluna) no Alto de Pinheiros e uma escola pública em Itaquaquecetuba – pior que escrever/ler é chegar, minha gente.
O engate de cenas vai mostrando, sem muito blá-blá-blá, as variáveis que atravessam todos os adolescentes, de todas as eras. Mostra, sem dó, o descaso dos professores “públicos” que já não acreditam em seus alunos – pagos com o meu, o seu, o nosso dinheirinho. Desvenda sonhos. Conta as poesias da Valéria (foto à direita), que ninguém acredita que é ela quem escreve. Mostra a crueldade (e clareza) dos infratores que só têm voz. Retrata a depressão e as dúvidas das meninas ricas, pressionadas pela escola canadense. Mostra a tristeza da Keila, em Itaquequecetuba, salva pelo fanzine da professora que falta porque não dá conta do dia-a-dia.
Encontram-se periferia e elite. Os mesmos abraços. As mesmas carnes firmes, trêmulas e sonhadoras. A elite se enquista. Enquanto a gente pode acompanhar a reunião de conselho em Duque de Caxias, no Alto de Pinheiros, só pode ver os adolescentes de bobeira no corredor. A perifa se revela, mostra cores, suores, sonhos. Ganha contornos e gosto próprio em Duque de Caxias, com o batuque e a dança. Tem o orgulho da comunidade em Itaquaquecetuba. E grita pela qualidade do Alto de Pinheiros.
Se resolvesse, eu mandava acorrentar os “puderosos” de Brasília na cadeira do cinema até aprenderem!
Trechinhos:
“Pôxa, os próprios caras grandes, lá, roubam da sociedade. Aí nós, que somos, vamos dizer assim… a sociedade que é minoria, nós não vamos roubar por causa de quê? (…) A criminalidade existe por causa deles mesmo, pô. eles plantam e estão colhendo o que plantaram” Menor Infrator
“Eu não queria ir pra escola, parei de sair com as minhas amigas, não conseguia estudar, chegava na hora da prova me dava branco e eu não conseguia lembrar das coisas, daí teve que ir cuidando de uma coisa, de outra…” Thaís, 15 anos, Alto de Pinheiros, São Paulo
“Antes (do fanzine) eu chegava da escola, deitava na cama e ficava o dia inteiro dormindo. Comia até deitada na cama, porque pra mim a solução dos meus problemas seria morrer. Seria mais fácil o caminho“, Keila, 16 anos, Itaquaquecetuba, São Paulo
“Eu deveria ter uma péssima impressão da vida
se não fosse a paixão que tenho pela arte de viver“, últimos versos de um poema de Valéria, 16 anos, Manari, sertão de Pernambuco
Pro Dia Nascer Feliz recebeu os seguintes prêmios em 2006: três prêmios na 29a. Mostra internacional de Cinema de São Paulo; mais três Kikitos em Gramado; Prêmio Especial do Juri em Recife e mais o Prêmio de Melhor Fotografia de Documentário pela Associação Brasileira de Cinematografia …
Ficha técnica
Fotografia: Gustavo Hadba
Trilha: Dado Villa-Lobos
Pesquisa: Renée Castelo Branco
Produção Flavio R. Tambellini
Direção, roteiro e edição: João Jardim (Janela da Alma, 2001)
A estréia está marcada para o dia 2 de fevereiro